Dia 9: Terça-Feira TRABADELO – PORTO MARÍN – FERREIROS
O dia amanheceu fresco, se bem que saímos cedo. Inicio de percurso plano e calmo, pois apesar de o camiño seguir pela estrada, havia pouco movimento. Com seis quilómetros percorridos, abandonamos a ciclovia da estrada nacional e tomámos o sentido de Ambasmestas onde tomámos o pequeno almoço, num simpático café junto à estrada.
Agora tínhamos cerca de oito quilómetros, em plano, para prepararmos as pernas para o que aí vinha - hoje era dia de ultrapassar o obstáculo chamado Cebreiro – seriam cerca de 800 mts de altímetria, se bem que cerca de 700 mts eram ganhos em cerca de sete quilómetros. As marcações do camiño orientam os ciclistas a seguirem por estrada a subida da montanha – e foi o que fizemos.
A um ritmo muito lento, metro a metro, por vezes desmontados das bicicletas, fomos ganhando altimetria. Ao longe era possível ver a localidade de La Faba enquanto nos aproximávamos de Laguna de Castilla. Aqui chegados, fizemos uma pausa para retemperarmos forças e repor energias com um pequeno lanche. Faltavam apenas três quilómetros para o topo da montanha, sendo que daqui seguimos pelo trilho. A cerca de um quilómetro do Cebreiro, surgiu o marco indicativo da entrada na Galiza – tirar a foto para marcar o momento e saber que Santiago já estava pertinho deu-me uma grande satisfação.
Pouco depois, aí estávamos nós na pequena localidade do Cebreiro. Sem nos determos por aqui, seguimos o camiño até ao Alto de San Roque, onde nos voltámos a separar. O trilho era bastante bom e agradável e do Alto do Poio para a frente ladeava a estrada durante alguns quilómetros. O andamento era agora rápido – foram cerca de catorze quilómetros a perder altitude desde os 1330 mts até aos 650 mts em Triacastela. A meio deste percurso, o camiño estava interrompido por motivo de obras e o desvio seguia por um trajecto pouco “pisado”, por meio de ervas e com uma inclinação bastante acentuada.
O almoço tinha sido marcado para Triacastela, pois era a maior localidade que passaríamos em muitos quilómetros. Ainda esperei bastante tempo pela Veronique, mas como não aparecia, decidi avançar com a refeição. Ao fim de algum tempo, a Veronique lá acabou por aparecer.
Da parte da tarde eu segui direito a Abalsa e a Veronique por Samos. O roadbook indicava uma ascensão de cerca de 220 mts até ao Alto de Riocabo. O camiño era bom, o piso era daquele asfalto mais barato mas onde se circula bem, e a envolvente era de um verde abundante que nos enche os pulmões.
Claro que com a barriga cheia custa sempre fazer subidas, mas chegando ao alto temos uma panorâmica muito vasta da Galiza, uma paisagem que nos enche os olhos. Para além disso, agora era sempre a descer até Sarria. Comecei a apanhar uns trilhos fantásticos, só comparados aos dos Pirinéus, já que também aqui é tudo muito verde – e lá fui, quilómetro atrás de quilómetro a desfrutar da minha viagem no meio da natureza.
Após Sarria, o caminho seguia por uma densa floresta de Carvalhos. Algumas das árvores faziam figuras muito sui generis, houve inclusive uma, que por fazer um arco no meio do caminho, me obrigou a desmontar da bicicleta de modo a poder passar por baixo dela. Continuando o caminho, iria ascender novamente outros 200 mts – esta parte do camiño é constituída por muitos montes e vales, pelo que andamos sempre acima e abaixo.
Um pouco à frente encontrava o marco que indicava que faltavam 100 km para Compostela. Ponto obrigatório de paragem para tirar uma foto, e para me encher de moral, pois teoricamente já só faltava uma etapa para concluir com sucesso esta peregrinação – foi um bom momento!
Entretanto já me encontrava perto de Ferreiros, localidade onde tinha combinado encontrar-me com a Veronique, já que havia nessa localidade um albergue e vindo da estrada não era muito longe. Cheguei primeiro. Já era tarde, cerca das 18:00h, contudo, sentia-me bem, inebriado com todos estes trilhos e ainda não me sentia satisfeito. Estudei o roadbook e vendo que Portomarin estava a somente dez quilómetros e que o trajecto era maioritariamente a descer, enviei um sms à Veronique a informar da alteração de planos.
Assim, lancei-me pelos trilhos abaixo, para no final do dia ficar a menos de 90 quilómetros de Santiago. Nova dose de adrenalina na descida até Portomarin, com algumas descidas muito técnicas, intervalados com pequenos troços de estradas que dividiam pequenas propriedades agrícolas.
Portomarin fica na margem do “nosso” rio Minho. Ao atravessar a ponte sobre o rio, encontrei um BTTista espanhol meu conhecido das etapas anteriores. Tivemos um pouco à conversa enquanto esperava pela Francesa. Informou-me que o albergue onde estava já estava cheio, pelo que enviei um sms à Veronique. Na resposta, disse-me que ficara por Ferreiros. Parti, então em busta de um albergue, pois há muitas camas em Portomarin. Corri um e outro e mais outro até ter passado por todos e já não havia lugar. Fiquei novamente numa situação incomoda e desta vez sozinho.
Já era tarde, seriam perto das 20:00h e ainda tinha de arranjar dormida. Pelas informações que tinha, havia um albergue a cerca de oito quilómetros à frente e depois outro a mais quatro, mas ambos com poucas camas. Com receio que também estivessem lotados, telefonei à Veronique a saber se ainda havia lugar onde ela estava – ainda havia! Decidi, então, voltar para Ferreiro, mas pela estrada, pois o caminho por onde tinha vindo teria sido muito difícil de se fazer a subir. Pus-me a caminho, apanhei uma via rápida cuja subida não via o fim (seriam cerca de oito quilómetros), estava a escurecer e tinha começado a cair umas pingas de chuva. Com quase 90 quilómetros e cerca de 2000 mts altimetria, via-me nesta situação!
Durante a subida ainda tentei arranjar boleia para Ferreiros, pois esta última subida e a ansiedade estavam a deitar-me abaixo – mas não consegui nada. Concluída a subida, encontrei a indicação para Ferreiros. Mais uns quilómetros e nada de Ferreiros. À passagem de um jipe (o único veículo que passou por mim depois de sair da estrada principal) pedi indicações. Perante a dificuldade de orientação acerca do que me estava a dizer, consegui convencer o condutor a ir lá pôr-me – e assim, lá me safei.
À chegada, lá estava a Veronique à minha espera. Quando entrei na camarata, já havia pessoas a dormir. Tomei um banho rápido, e relaxei um pouco enquanto jantava umas setas (cogumelos com arroz). Um pouco de conversa com a Veronique e fomos descansar.
O Albergue era gratuito. Era um anexo ao restaurante onde tinha sido colocadas várias camas – tinha um ar estranho e confuso, até porque eu já apanhei o ambiente de penumbra. No entanto, na situação em que eu estava, pareceu-me um sitio magnifico.
O balanço do dia foi neutro. A etapa foi dura com a subida ao Cebreiro, mas senti-me bem fisicamente. Estava bastante animado, os trilhos eram fantásticos e o dia tinha fluído bem, até saber que não tinha dormida em Portomarin. Foi mais uma lição! E talvez não tenha tomado a melhor decisão para resolver o problema, contudo este foi resolvido, e também por isso me sentia satisfeito.
Outra das contrariedades, foi ter descoberto de manhã que o LCD da minha máquina fotográfica tinha estalado – deixava de poder gerir o cartão de memória, sabendo que já não tinha muito espaço para fotografias. Continuei na mesma a fazer a reportagem fotográfica, mas tirei poucas fotos nas últimas etapas, pois queria ter certeza que chegava a Santiago e registava o momento – isto assumindo que a máquina gravava as fotos!
Dados da etapa:
Distância: 102 km
Altimetria: 2380 mts
Tempo de deslocação: 08:50h
Média deslocação: 11,5 km/h
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