Friday, February 11, 2011

Caminho Francês de Santiago de compostela - Dia 11

Dia 11: Quinta-Feira MONTE DO GOZO – SANTIAGO DE COMPOSTELA


Acordei com a sensação de estar a chover – como era possível depois do dia anterior tão quente! Foi só impressão, estava somente escuro e havia muita humidade no ar. Restabelecido deste susto, coloquei-me ao caminho. Queria passar à estação de camionagem antes de chegar à catedral, pois queria confirmar a minha viajem com inicio às 10:30h.



O trajecto é praticamente urbano. Seguindo as marcações do caminho cravadas no chão, fui-me aproximando do fim da minha odisseia. Ainda com poucas pessoas nas ruas, eis-me chegado à catedral. De imediato passei pela Plaza do Obradoiro, onde selei com umas fotos o momento. Foi uma boa sensação, um pouco de missão cumprida e de muita satisfação e felicidade.



Felicidade também por ter chegado a hora de voltar para casa, onde tinha à minha espera as pessoas que amo. As saudades já eram muitas e a ansiedade crescia.



Contudo ainda era cedo para o expresso e a oficina do peregrino só abria às 09:30h – aí iria levantar o certificado da peregrinação. Tinha por isso algum tempo livre. Passei esse tempo a fazer turismo? Não! Passei o tempo à procura de uma empresa de transporte de bicicletas pois o expresso que ia apanhar, não fazia o transporte deste tipo de bagagem para Portugal (para Espanha faziam!?)


Resolvido este último problema, fui levantar o certificado de peregrino.



Este diploma para além de ser um belo recuerdo, é um motivo de orgulho enorme e o concretizar de um sonho. A experiência vivida foi bem melhor que a expectativa que levava. E se por um lado é maravilhoso concretizar o camiño, a sensação seguinte é a de enorme saudade. Decididamente O camiño marca-nos para a vida e estou muito feliz por o ter feito.


*


Querem um conselho? Vivam esta experiência, a pé ou de bicicleta – é um momento muito bonito nas nossas vidas e vão de certeza gostar. Eu amei!


*

Caminho Francês de Santiago de compostela - Dia 10

Dia 10: Quarta-Feira FERREIROS – MONTE DO GOZO


Esta iria-se revelar uma etapa difícil. Comecei por repetir o troço até Portomarin, desta vez na companhia da Veronique que uma vez mais se safou muito bem. Reforço a ideia de que era um trilho bastante técnico, a exigir perícia e atenção. Contudo, começar o dia de forma tão divertida faz-nos esquecer que temos uma vida de rotina à nossa espera!


Chegados a Portomarin, era hora de nos separarmos – esta seria a última vez. Foi com muita tristeza que me despedi da minha boa companheira de viagem, mas tínhamos camiños diferente para seguir - c’est la vie.


O camiño seguia por alguns bons trilhos que nos primeiros dez quilómetros obrigava a subir cerca de 340 mts. Por vezes afastava-se da estrada nacional, mas a maior parte do caminho até Palas de Rei seguia paralelamente à estrada. A quantidade de peregrinos caminhantes a esta hora era impressionante, o que me obrigava muitas vezes a seguir pela estrada nacional – era a hora de ponta!


O caminho atravessava várias pequenas aldeias, num ambiente claramente rural. E o trajecto era de um sobe e desce constante, a tornar a etapa dura, apesar de bonita. Numa das aldeias, enquanto tomava um lanche, vi passar o casal de Málaga. Cumprimentei-os com um aceno à sua passagem enquanto os via afastarem-se – provavelmente chegariam hoje a Compostela!


Voltando à estrada, e já perto de Melides, encontrei três peregrinos a cavalo (só tinha visto outros depois de Puente la Reina). Esta seria a segunda forma mais comum de viajar antes do aparecimento da bicicleta, mas nos dias de hoje já se torna uma raridade – encontrar estes peregrinos trás um misticismo especial ao camiño.



Por esta altura já as nuvens tinham desaparecido, dando lugar a um céu azul intenso, que embelezava ainda mais o caminho. Como não há bela sem senão, também o calor se tornou intenso, representando mais um obstáculo no dia de hoje!


Passagem pela localidade de Boente onde se encontra o marco a indicar a distância de 50 quilómetros – ponto obrigatório para mais uma foto. A localidade de Arzúa já se encontrava próximo. Chegar a esta cidade representava que já só faltava um terço do caminho até Compostela. Atravessei as suas ruas, e encontrei uma praça onde estava muita gente – aí estavam a almoçar os espanhóis que encontrei em Portomarin. Tivemos um pouco a trocar impressões sobre como tinha resolvido o meu problema de alojamento e como estava a decorrer o dia. Aproveitei para encher o cantil numa fonte e voltar ao caminho. Procurava agora encontrar onde almoçar numas das pequenas aldeias que tinha pela frente. Assim foi, cerca de cinco quilómetros depois encontrei um restaurante de estrada (a estrada era o trilho) com esplanada e tudo. Um bom local para descansar e me refrescar com uma bela caña.


Enquanto almoço, ouço atrás de mim um “então, tudo bem?” dirigido a mim. Tinham acabado de chegar três BTTistas portugueses, que ao reconhecerem o meu jersey (da maratona de Portalegre) identificaram-me como conterrâneo. Estivemos um pouco à conversa, fiquei a saber que estavam a fazer o caminho do Norte e que iriam até Finisterra.


O trilho seguia agora à sombra de umas árvores frondosas, o que sem dúvida ajudou na realização destes primeiros quilómetros depois do almoço. Até porque o trajecto iria endurecer e o calor, forte, não iria ajudar nada - o meu ritmo de pedalada começava a baixar consideravelmente.


O mais penoso foi fazer uma elevação de cerca de 130 metros em cerca de seis quilómetros praticamente sem sombra – foi sufocante! No final contornava-se o aeroporto e entrava-se num trilho muito bem arranjado, com placas indicativas e zonas de descanso. Passava-se depois para um trilho, a descer, de cerca de quatro quilómetros pelo meio da mata, onde no final se tinha de atravessar um túnel que cruzava a estrada nacional para se chegar a Lavacolla. Novamente outra subida, desta vez em estrada asfaltada com cerca de três quilómetros e mais cem metros de altimetria.


Vencendo este obstáculo, o dia estava praticamente concluído pois Monte do Gozo estava perto e eu ficaria por ali. E assim foi, mais dois ou três quilómetros e lá estava a indicação para o super albergue do Monte do Gozo. À entrada do recinto, tempo ainda para uma foto, pois existe um grande monumento dedicado aos peregrinos.


O albergue como referi era super, parece que tem 800 camas e realmente mais parece uma cidade de peregrinos. Para além dos alojamentos, tem ainda amplas áreas com restaurantes e cafés, esplanadas, lavandarias, hotel, entre outras facilidades. As camaratas e os balneários também estavam muito bem.


O balanço hoje foi positivo – estava às portas de Compostela. Estava agora sozinho, mas o camiño, apesar de duro, tinha sido espectacular. E o facto de ter chegado aqui, a somente cinco quilómetros de objectivo, significava que iria conseguir concluir a minha demanda por terras espanholas, situação que cheguei a por em causa ao segundo dia. Estava muito feliz.


Dados da etapa:
Distância: 95,5 km
Altimetria: 1750 mts
Tempo de deslocação: 07:58h
Média deslocação: 12 km/h

Caminho Francês de Santiago de compostela - Dia 9

Dia 9: Terça-Feira TRABADELO – PORTO MARÍN – FERREIROS


O dia amanheceu fresco, se bem que saímos cedo. Inicio de percurso plano e calmo, pois apesar de o camiño seguir pela estrada, havia pouco movimento. Com seis quilómetros percorridos, abandonamos a ciclovia da estrada nacional e tomámos o sentido de Ambasmestas onde tomámos o pequeno almoço, num simpático café junto à estrada.



Agora tínhamos cerca de oito quilómetros, em plano, para prepararmos as pernas para o que aí vinha - hoje era dia de ultrapassar o obstáculo chamado Cebreiro – seriam cerca de 800 mts de altímetria, se bem que cerca de 700 mts eram ganhos em cerca de sete quilómetros. As marcações do camiño orientam os ciclistas a seguirem por estrada a subida da montanha – e foi o que fizemos.



A um ritmo muito lento, metro a metro, por vezes desmontados das bicicletas, fomos ganhando altimetria. Ao longe era possível ver a localidade de La Faba enquanto nos aproximávamos de Laguna de Castilla. Aqui chegados, fizemos uma pausa para retemperarmos forças e repor energias com um pequeno lanche. Faltavam apenas três quilómetros para o topo da montanha, sendo que daqui seguimos pelo trilho. A cerca de um quilómetro do Cebreiro, surgiu o marco indicativo da entrada na Galiza – tirar a foto para marcar o momento e saber que Santiago já estava pertinho deu-me uma grande satisfação.



Pouco depois, aí estávamos nós na pequena localidade do Cebreiro. Sem nos determos por aqui, seguimos o camiño até ao Alto de San Roque, onde nos voltámos a separar. O trilho era bastante bom e agradável e do Alto do Poio para a frente ladeava a estrada durante alguns quilómetros. O andamento era agora rápido – foram cerca de catorze quilómetros a perder altitude desde os 1330 mts até aos 650 mts em Triacastela. A meio deste percurso, o camiño estava interrompido por motivo de obras e o desvio seguia por um trajecto pouco “pisado”, por meio de ervas e com uma inclinação bastante acentuada.



O almoço tinha sido marcado para Triacastela, pois era a maior localidade que passaríamos em muitos quilómetros. Ainda esperei bastante tempo pela Veronique, mas como não aparecia, decidi avançar com a refeição. Ao fim de algum tempo, a Veronique lá acabou por aparecer.


Da parte da tarde eu segui direito a Abalsa e a Veronique por Samos. O roadbook indicava uma ascensão de cerca de 220 mts até ao Alto de Riocabo. O camiño era bom, o piso era daquele asfalto mais barato mas onde se circula bem, e a envolvente era de um verde abundante que nos enche os pulmões.


Claro que com a barriga cheia custa sempre fazer subidas, mas chegando ao alto temos uma panorâmica muito vasta da Galiza, uma paisagem que nos enche os olhos. Para além disso, agora era sempre a descer até Sarria. Comecei a apanhar uns trilhos fantásticos, só comparados aos dos Pirinéus, já que também aqui é tudo muito verde – e lá fui, quilómetro atrás de quilómetro a desfrutar da minha viagem no meio da natureza.


Após Sarria, o caminho seguia por uma densa floresta de Carvalhos. Algumas das árvores faziam figuras muito sui generis, houve inclusive uma, que por fazer um arco no meio do caminho, me obrigou a desmontar da bicicleta de modo a poder passar por baixo dela. Continuando o caminho, iria ascender novamente outros 200 mts – esta parte do camiño é constituída por muitos montes e vales, pelo que andamos sempre acima e abaixo.



Um pouco à frente encontrava o marco que indicava que faltavam 100 km para Compostela. Ponto obrigatório de paragem para tirar uma foto, e para me encher de moral, pois teoricamente já só faltava uma etapa para concluir com sucesso esta peregrinação – foi um bom momento!



Entretanto já me encontrava perto de Ferreiros, localidade onde tinha combinado encontrar-me com a Veronique, já que havia nessa localidade um albergue e vindo da estrada não era muito longe. Cheguei primeiro. Já era tarde, cerca das 18:00h, contudo, sentia-me bem, inebriado com todos estes trilhos e ainda não me sentia satisfeito. Estudei o roadbook e vendo que Portomarin estava a somente dez quilómetros e que o trajecto era maioritariamente a descer, enviei um sms à Veronique a informar da alteração de planos.


Assim, lancei-me pelos trilhos abaixo, para no final do dia ficar a menos de 90 quilómetros de Santiago. Nova dose de adrenalina na descida até Portomarin, com algumas descidas muito técnicas, intervalados com pequenos troços de estradas que dividiam pequenas propriedades agrícolas.


Portomarin fica na margem do “nosso” rio Minho. Ao atravessar a ponte sobre o rio, encontrei um BTTista espanhol meu conhecido das etapas anteriores. Tivemos um pouco à conversa enquanto esperava pela Francesa. Informou-me que o albergue onde estava já estava cheio, pelo que enviei um sms à Veronique. Na resposta, disse-me que ficara por Ferreiros. Parti, então em busta de um albergue, pois há muitas camas em Portomarin. Corri um e outro e mais outro até ter passado por todos e já não havia lugar. Fiquei novamente numa situação incomoda e desta vez sozinho.


Já era tarde, seriam perto das 20:00h e ainda tinha de arranjar dormida. Pelas informações que tinha, havia um albergue a cerca de oito quilómetros à frente e depois outro a mais quatro, mas ambos com poucas camas. Com receio que também estivessem lotados, telefonei à Veronique a saber se ainda havia lugar onde ela estava – ainda havia! Decidi, então, voltar para Ferreiro, mas pela estrada, pois o caminho por onde tinha vindo teria sido muito difícil de se fazer a subir. Pus-me a caminho, apanhei uma via rápida cuja subida não via o fim (seriam cerca de oito quilómetros), estava a escurecer e tinha começado a cair umas pingas de chuva. Com quase 90 quilómetros e cerca de 2000 mts altimetria, via-me nesta situação!


Durante a subida ainda tentei arranjar boleia para Ferreiros, pois esta última subida e a ansiedade estavam a deitar-me abaixo – mas não consegui nada. Concluída a subida, encontrei a indicação para Ferreiros. Mais uns quilómetros e nada de Ferreiros. À passagem de um jipe (o único veículo que passou por mim depois de sair da estrada principal) pedi indicações. Perante a dificuldade de orientação acerca do que me estava a dizer, consegui convencer o condutor a ir lá pôr-me – e assim, lá me safei.


À chegada, lá estava a Veronique à minha espera. Quando entrei na camarata, já havia pessoas a dormir. Tomei um banho rápido, e relaxei um pouco enquanto jantava umas setas (cogumelos com arroz). Um pouco de conversa com a Veronique e fomos descansar.


O Albergue era gratuito. Era um anexo ao restaurante onde tinha sido colocadas várias camas – tinha um ar estranho e confuso, até porque eu já apanhei o ambiente de penumbra. No entanto, na situação em que eu estava, pareceu-me um sitio magnifico.


O balanço do dia foi neutro. A etapa foi dura com a subida ao Cebreiro, mas senti-me bem fisicamente. Estava bastante animado, os trilhos eram fantásticos e o dia tinha fluído bem, até saber que não tinha dormida em Portomarin. Foi mais uma lição! E talvez não tenha tomado a melhor decisão para resolver o problema, contudo este foi resolvido, e também por isso me sentia satisfeito.


Outra das contrariedades, foi ter descoberto de manhã que o LCD da minha máquina fotográfica tinha estalado – deixava de poder gerir o cartão de memória, sabendo que já não tinha muito espaço para fotografias. Continuei na mesma a fazer a reportagem fotográfica, mas tirei poucas fotos nas últimas etapas, pois queria ter certeza que chegava a Santiago e registava o momento – isto assumindo que a máquina gravava as fotos!


Dados da etapa:
Distância: 102 km
Altimetria: 2380 mts
Tempo de deslocação: 08:50h
Média deslocação: 11,5 km/h

Caminho Francês de Santiago de compostela - Dia 8

Dia 8: Segunda-Feira RABANAL DEL CAMINO - TRABADELO


Eram cerca das 07:20h da manhã quando nos fizemos à montanha. Desta vez saímos e fomos tomar o pequeno almoço na localidade seguinte, Foncebadón, a seis quilómetros de distância. Este troço, feito por estrada, era o que apresentava um declive maior. Voltando à estrada, continuámos a subir a montanha e dois quilómetros depois alcançámos a Cruz de Ferro.



Vários peregrinos por ali se juntavam, tirando as suas fotos, ou realizando o ritual de ofertar a Cruz com as suas “pedras”, como é tradição, assim como outras “dádivas”. Também eu tirei a minha foto, e também eu ofertei a Cruz com duas pedras, uma pequena pedra, minha, que carreguei durante o caminho e outra de uma alemã que em Burgos me pediu esse favor. Tentei também deixar as “pedras” da minha vida e do meu camiño – não sei se fui bem sucedido!


Começámos a descer. Inicialmente fui pelo trilho, mas como era muito estreito, e havia muitos peregrinos, avançava muito devagar já que tinha de parar muitas vezes. Decidi, então, voltar à estrada e juntar-me novamente à Veronique. Com declives superiores a 10%, a descida fez-se a grande velocidade. Por nós passaram os dois companheiros espanhóis com quem tinha estado ontem. Passamos por El Acebo, e depois por Riego de Ambrós e finalmente chegamos à bonita localidade de Molinaseca, onde parámos um pouco. Estávamos praticamente no sopé da montanha, e eu iria novamente apanhar o camiño – combinei encontrar-me com a Veronique em Ponferrada a oito quilómetros dali.



Daqui até Ponferrada o caminho não apresentava dificuldades de maior, nem tinha motivos de interesse pelo que em cerca de trinta minutos cheguei a Ponferrada. Esta cidade é digna de ser visitada, com o seu bonito castelo, as suas praças e igrejas. Aproveitei para fazer um pouco de geocaching e conhecer um pouco da cidade. Foi no meio desta actividade que reencontrei a Veronique. Terminado o turismo, voltámos ao caminho, mas não por muito tempo, pois seis quilómetros depois, em Camponaraya, fizemos nova paragem, desta vez para almoçar.


O calor voltava a manifestar-se com força, e ainda só tínhamos realizado metade da etapa de hoje. O meu objectivo era chegar a Vega de Valcarce, no sopé da montanha do Cebreiro, a montanha mais difícil de todo o trajecto.


Passámos a Cacabelos e cruzamos um bonito rio em Pieros. As pequenas subidas que nos iam surgindo transformavam-se em grandes dificuldades devido ao muito calor que se sentia. Esta parte do percurso era comum com a estrada nacional. Só um pouco depois de Pieros é que o camiño se separava da estrada. Uma vez mais, eu tomei o caminho e a Veronique a estrada e seguimos separados até à localidade seguinte. Por esta altura do dia já se vêem poucos peregrinos e o caminho torna-se mais deserto. O trilho seguia subindo um pequeno monte para depois voltar a descer em direcção a Villafranca del Birzo.


Esta pequena localidade surpreendeu pelas muitas e bonitas igrejas. Quando eu cheguei já a Veronique estava à minha espera. Seguimos caminho, deixando esta localidade para trás. Íamos agora novamente em estrada, cuja direcção nos levava à estrada nacional. Aí, apanhamos uma ciclovia que ladeava de um lado a estrada nacional e do outro o rio Valcarce. Felizmente as margens do rio são muito arborizadas, o que para além do fresco da sombra, tornava o caminho muito agradável. Passamos a Pereje e a cerca de um quilómetro de Trabadelo a Veronique verificou que tinha o pneu a esvaziar.


Acabamos por ir a pé até à vila, e decidimos ficar por ali, pelo que arranjámos alojamento e só depois trocámos a câmara de ar do pneu. A minha ideia de ir até Vega de Valcarce, a menos de dez quilómetros de Trabadelo, ficava pelo caminho. Mas não insisti para avançarmos por parecer-me que a Veronique já vinha esgotada, e eu também me sentia moído, pois o dia tinha estado muito quente.


O albergue não era mau. Nós ficamos num quarto na “cave” cujo acesso era pelo terraço. Os sanitário eram no piso de cima, e para aceder tínhamos de ir pela rua, por umas escadas até à entrada principal do albergue. Mas tinha todas as condições.


Dia positivo. Passamos por um dos pontos mais difíceis do camiño – o mítico alto da Cruz de Ferro, e avançamos o suficiente para voltarmos a encarar a próxima montanha logo pela manhã, como fizemos hoje. Era tempo de descansar. Infelizmente, um dos peregrinos caminhantes estava bastante alcoolizado, pelo que parte da noite passei a tentar que ele dormisse – enfim, coisas da vida.


Dados da etapa:
Distância: 71,3 km
Altimetria: 868 mts
Tempo de deslocação: 05:57h
Média deslocação: 12 km/h

Caminho Francês de Santiago de compostela - Dia 7

Dia 7: Domingo MANSILLA DE LAS MULAS – RABANAL DEL CAMINO

Hoje era dia de passar em duas cidades importantes – León e Astorga.


Saí do albergue com o pequeno almoço tomado cerca das 07:20h em direcção a León. Foram cerca de 16 quilómetros, desta vez por um trilho que também ladeava a estrada nacional, mas que tinha bem mais vegetação, pelo que era muito mais agradável de se fazer. Cruzei duas pequenas povoações e alcancei as imediações de León.


Nestas grandes cidades a atenção tem de ser redobrada, pois é mais fácil perder-mos o camiño devido à constante mutação destes pólos concentrados de civilização e de por vezes o caminho seguir por vias nem sempre óbvias.


Atravessada uma via rápida por uma ponte pedonal, o camiño, bem arranjado, seguiu por uma zona habitacional até entrar na zona mais central e histórica de León. Como era Domingo, havia muito pouco movimento, estando as ruas bastante desertas. León é uma cidade bonita, com edifícios públicos e religiosos de elevada beleza arquitectónica complementados por um bonito rio que embeleza ainda mais esta magnifica cidade.



Uma vez mais encontrei o casal de Málaga. Estes estavam a iniciar a sua jornada, pelo que os acompanhei até à saída da cidade, onde nos separámos. Eu segui durante algum tempo com outros dois ciclistas espanhóis que tinha conhecido dois dias antes. O trilho que saía da cidade era largo e de bom piso. Ascendemos cerca de cem metros até San Miguel del Camino para depois o caminho voltar a ser plano durante mais trinta quilómetros.



Aqui, e novamente sozinho, julgo ter apanhado um caminho alternativo, pois não era o que tinha no GPS nem o que estava no roadbook, contudo foi o caminho por onde indicavam as marcações que encontrei e por onde vi seguir alguns peregrinos caminhantes. Uma parte era em trilho, mas outra, cerca de dez quilómetros era em asfalto, em recta, do tipo lezíria do Ribatejo, com vários campos agrícolas a ladear a estrada.



Hospital de Órbigo foi a localidade que surgiu em seguida - pequena, com aspecto medieval mas bonita. Na zona do rio, após atravessada a ponte romana, havia um campo para disputar as justas, torneios de combates medievais de homens montados em cavalos que tentam derrubar o opositor com lanças de madeira. Teria sido um acontecimento curioso de acompanhar.


Seguindo em frente em direcção a Astorga, julgo que uma vez mais apanhei outro caminho que não estava no roadbook. Atravessei a localidade de San Justo de la Vega, apanhei um trilho monte acima, com muita pedra a requerer alguma técnica. Apesar da dificuldade da subida, o esforço era gratificante depois que tantas dezenas de quilómetros em terreno plano. No topo da colina, no meio do nada, estava um tipo de Barcelona que ali tinha um banca de venda, com bebidas frescas, artigos de artesanato entre outras coisas – claro que por ali se aglomeravam alguns peregrinos, sobretudo para beber uma limonada fresca.


Deste ponto até Astorga era sempre a descer, pelo que foi com rapidez que lá cheguei. Astorga também é uma cidade muito bonita, e muito bem arranjada – destaco a catedral, as igrejas, as praças e um edifício com arquitectura Gaudi. Depois de uma volta pela cidade sentei-me numa esplanada e almocei.


O conta-quilómetros marcava cerca de 70 quilómetros e eu ainda queria avançar mais um pouco no camiño, de modo a ficar mais perto da mítica “Cruz de Ferro”, o ponto mais alto do circuito a 1504 mts de altimetria. Iniciei a subida da serra, em ritmo lento, pois estava de barriga cheia. A ideia era ir até Rabanal del Camino, onde havia vários albergues, a cerca de vinte e poucos quilómetros de Astorga, subindo suavemente dos 830 mts até aos 1150 mts. Deste modo, ficavam a faltar apenas cerca de oito quilómetros até à Cruz de Ferro, trajecto esse que realizaria na manhã seguinte pela fresca.


Na localidade de Sta Catalina de Somoza reencontrei a minha amiga Veronique, que por ali estava a almoçar. Fiquei a saber que tinha pernoitado em León, e que estava muito contente por ter realizado pela primeira vez uma centena de quilómetros! Estava realmente de parabéns!


O camiño tornava-se diferente, agora com as montanhas como pano de fundo. O trilho, de muito boa qualidade, ladearia a estrada até perto do nosso destino. Lentamente, sob um calor abrasador, e já com algum cansaço, continuámos o caminho, primeiro até El Ganso e depois até Rabanal del Camino. Quando chegamos procuramos o albergue municipal, mas não nos agradou, pelo que ficamos no albergue ao lado – o “El Pilar”.


O albergue já tinha muitos peregrinos, que ocupavam um bonito pátio, que tornava o local castiço. As condições eram boas, e a hospitaleira muito simpática e prestável. Ainda houve tempo de visitar esta pequena localidade, e beber uma caña de fim de tarde.



Hoje foi um dia mais entusiasmante, com a passagem por muitas localidades e com o ressurgimento dos montes e montanhas. Por outro lado voltava a ter companhia, o que é sempre bom. Em termos físicos, a quilometragem fala por si. De negativo, apenas o comportamento de um grupo numeroso de BTTistas que desestabilizou o dormitório quando a maioria de nós já descansava!





Dados da etapa:
Distância: 95 km
Altimetria: 847 mts
Tempo de deslocação: 08:48h
Média deslocação: 12,2 km/h